Na manhã deste triste 13 de março, véspera do Dia Nacional da Poesia, o Padre Ernesto Sassida, poeta da infância e da inclusão social, se eternizou, depois de 11 dias de resistência renhida no CTI do Hospital de Caridade de Corumbá, onde foi internado para tratar uma pneumonia que acabou agravando sua frágil saúde. Do alto de seus 93 anos de vida e de décadas dedicadas à sua missão de salesiano na cidade que o recebeu ainda adolescente e para a qual dedicou os melhores anos de sua vocação, deixou um exemplo para a posteridade, que nem o tempo nem a apatia atávica de seus contemporâneos poderão ignorar.
A despeito de sua formação conservadora, o Padre Ernesto, fiel à formação estoica de missionário do início do século XX, soube conviver com pessoas de concepções religiosas, filosóficas e até ideológicas diversas, próprias de um cidadão do mundo e à frente de seu tempo. Como poucos salesianos (como ele conheci apenas outro salesiano, mas de ideias progressistas, o Padre Pasquale Forin, com quem, aliás, soube conviver apesar das diferenças de opinião), desenvolveu uma obra social pioneira não apenas pelas dimensões, mas pela interdisciplinaridade, num tempo em que praticar ações intersetoriais (educação, saúde, assistência social, cultura, esportes, formação para o trabalho e cidadania) era uma utopia, ainda mais em se tratando de arrecadar fundos, como ele conseguira fazer, espalhados pelo mundo, sem qualquer respaldo local.
Ouso dizer que ele, com sua obstinação cidadã e o respaldo de sua congregação, fez muito mais pela inclusão social das crianças e dos jovens nesta região de fronteira que todos os administradores municipais e estaduais fizeram com recursos públicos em toda a história de Corumbá. Em nosso encontro derradeiro no final do ano passado, o Padre Ernesto surpreendia pelo entusiasmo e pela inesgotável ânsia de revitalizar o sua sempre pioneira obra social, apesar das cinco décadas de existência. Sua última estratégia para manter a concepção de integralidade de sua iniciativa interdisciplinar foi a fundação do Clube de Mães da Cidade Dom Bosco com o lançamento de um periódico impresso para as famílias assistidas pelos diversos projetos da Cidade Dom Bosco, que junto ao Centro Padre Ernesto de Promoção Humana e Ambiental (CENPER), ao Clube dos Amigos do Padre Ernesto e à União dos Ex-alunos da Cidade Dom Bosco (UECDB) formam a rede de ações interligadas que o jovem nonagenário deixou para que a obra social que idealizou e conseguiu realizar se mantenha atual para a posteridade, sem perder sua razão de ser.
Por seu legado, por seu amor e sobretudo pela dedicação incansável a uma causa nem sempre bem compreendida, o Padre Ernesto ganhou o respeito e a admiração de todo(a)s o(a)s que o conheceram. Nós, que partilhamos de algumas de suas lutas, temos certeza de que sem sua sabedoria e, acima de tudo, teimosia cidadã, Corumbá e a humanidade perdem bastante. Mas fica a esperança de que o seu generoso legado fecunde nas mentes e corações moços e a sua inquietude construtiva de jovem idealista e realizador se multiplique nas novas gerações.
Até sempre, Padre Ernesto, grande Amigo e Companheiro de causas nobres!
Por: Ahmad Schabib Hany