No meu discurso de posse como presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado, em 27 de fevereiro, desafiei o Congresso Nacional – e a mim próprio – a buscar formas para financiar a saúde pública no Brasil. Os senadores entenderam a mensagem, tanto que duas semanas depois foi instalada uma comissão temporária para discutir o financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS). Começamos bem.
A ideia colocada por nós na Comissão de Assuntos Sociais é promover debates com autoridades e especialistas e reunir todos os projetos que tramitam na Casa, conhecê-los, melhorá-los e adequá-los para que possam ser votados rapidamente. A instalação desse colegiado apontará os caminhos para que a saúde do país receba recurso suficiente para fornecer cuidados de saúde primária, medicamentos e cirurgias, leitos, médicos e enfermeiros em números recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), entre outras necessidades.
Quando o Congresso Nacional regulamentou a Emenda Constitucional (EC) nº 29, de 2000, em dezembro de 2011, firmei posição de que era injusto impor percentuais mínimos de investimento no setor a Estados e municípios, deixando a União de fora. A mídia nacional, na ocasião, repercutiu nosso posicionamento e do qual não me arredo. Até porque já se passou um ano e nada mudou.
A EC 29 estabeleceu patamar de recursos mínimos para o financiamento de ações e serviços públicos de saúde. Pela norma, Estados são obrigados a aplicar 12% de sua receita, municípios, 15% e a União o valor do ano anterior, corrigido pela variação do Produto Interno Bruto (PIB). O seu propósito era ser uma solução duradoura para o adequado financiamento do SUS, de forma a possibilitar a manutenção de um sistema efetivo no atendimento das necessidades de saúde da população.
Estudo encomendado por mim à Consultoria Legislativa do Senado reforça que os problemas relativos ao financiamento do SUS não foram equacionados e ainda somos um dos países que menos investem em saúde, com valores per capita abaixo daqueles aplicados por diversos países vizinhos.
Considerando-se o total de gastos com saúde, e não apenas o gasto público, o Brasil apresenta um percentual próximo aos 8,5% do PIB, valor próximo ao de países desenvolvidos que contam com sistemas universais de saúde. Entretanto, diferentemente do que ocorre naqueles países, onde a quase totalidade desse gasto é de origem pública, estima-se que, no Brasil, pelo menos 53% do total são gastos privados: das empresas e das famílias, com planos de saúde, medicamentos e outras despesas.
Ressalte-se que, ao longo do tempo, a parcela de recursos federais foi reduzida em relação à receita corrente da União. De 1995 a 2004, enquanto a receita corrente cresceu de 19,7% para 26,7% do PIB, a participação do orçamento do Ministério da Saúde na receita corrente caiu de 9,6% para 7,5%. Fica, portanto, evidenciado que o critério de vinculação de recursos da União para a saúde – a variação nominal do PIB – não acompanha a inflação residual e gera perdas para o setor saúde.
Em 2009, o país investiu R$ 270 bilhões em saúde. Desse montante, R$ 127 bilhões do setor público (União, Estados e municípios) e R$ 143 bilhões da iniciativa privada. Do total público aplicado naquele ano, o Governo federal respondeu por 22% dos gastos, enquanto os governos estaduais e municipais por 26%. Entre 1995 e 2010, a participação da União no financiamento da saúde pública caiu de 64% para 45%. Ao mesmo tempo, as despesas dos Estados saltaram de 19% para 27% e as dos municípios de 17% para 28%.
É possível dizer, portanto, que a tão esperada regulamentação da EC 29, de 2000, não trouxe a solução necessária para a crise de financiamento do SUS, especialmente por ter mantido a sistemática até então adotada de repasse de recursos mínimos pela União, motivo pelo qual a Comissão de Assuntos Sociais do Senado decidiu não apenas trazer à tona novamente a questão, como buscar formas para solucioná-la de uma vez por todas.
Por: (*) Waldemir Moka
(*) É senador da República, médico, presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado