Corumbá

Finados: Dor e revolta no cemitério Nelson Chamma em Corumbá

Dezoito caminhões de aterro que adubavam a Praça José de Souza Dami tiveram que retomar ao cemitério, entretanto, os ossos se misturaram impossibilitando a identificação dos corpos

 

Vilipêndio de cadáver : Famílias voltavam para casa com velas, flores e lágrimas depois peregrinar o cemitério Nelson Chamma em busca de lapides ou sepulturas dos parentes

Familiares de sepultados no cemitério Nelson Chamma choraram a dor do descaso e desrespeito com os mortos. Após peregrinar horas a fio procurando a sepultura dos entes queridos, encontraram apenas um cadáver identificado no ossuário, completamente destruído. Indignados com os pedaços de lápides jogados embaixo das arvores, sem, contudo localizarem as sepulturas, voltaram para casa com o gosto amargo na boca, e o choro contido por perder a última referencia com a família.

Paula Rodrigues, estudante de 20 anos , acompanhada das outras irmãs, largaram entre os túmulos que sobraram as flores que levavam para a mãe, falecida há pouco mais de dois anos, “não sei o que dizer. Não tínhamos condições de fazer seu sepultamento em outro local, nunca jamais imaginei uma coisa desta. Aqui é cemitério de pobre e pobre não tem vez, não pode reclamar, não pode fazer nada”. Os familiares de Daniel Hortiz, se desesperaram, porque não sabiam o que havia acontecido com o cemitério, porque o tumulo com os restos mortais desapareceu. Para a viúva, Marisa Sena Hortiz, moradora da Rua Firmo de Matos, 2229, a situação foi mais dolorosa, porque nem a placa sobrou, “já procurei entre as arvores junto com as que estão jogadas. Minhas filhas percorreram todo o cemitério e não encontraram o túmulo. Não sei o que dizer, mas garanto que é muito triste”, disse Hortiz.

Outra reclamação dos que visitaram aquele campo santo também procede. Não teve missa, nem uma celebração, “a diocese falou que faria uma missa aqui, mas ninguém viu. Enquanto no cemitério santa cruz teve quatro missas. Em cemitério de pobre é assim, ninguém liga, mas garanto que se mexesse com o tumulo dos ricos a história seria bem diferente. Vivemos a pior dor do mundo em saber que o corpo de um parente, de um filho , da mãe, do marido, foi jogado como lixo. Isso é desumano, imoral e criminoso. Os responsáveis têm que ser punidos”, desabafou Eliane. Placas de lápides escoradas em arvores, junto com roupas e dentadura de falecidos compunham o cenário do cemitério Nelson Chamma nesta quarta-feira (02) de Novembro , dia de finados. Cena digna de uma pintura sombria.

Centenas de pessoas que entraram no Nelson Chamma para visitar túmulos de pais, filhos e outros parentes retornaram para casa com a sensação de impunidade que permeia as administrações públicas no país. Era uma multidão de pessoas chorando no meio fio que,da acesso a rodovia Ramon Gomez, num misto de dor e revolta. Alguns falaram a reportagem do Capital do Pantanal outros preferiram se calar, “deixa sofrermos nossa dor em silencio”, disse a mãe de um jovem morto há um ano e meio, “não jogaram restos antigos, jogaram o que acharam pela frente. É como se fossemos animais e não tivéssemos sentimentos”, disse a mulher que pediu para não ser identificada porque tem filhos trabalhando na prefeitura de Corumbá, “tenho medo filha. A vida esta muito difícil. Não tem emprego”, desabafou voltando para casa com velas e flores, já murchas pelo sol escaldante do dia, e a intensa e infrutífera busca.

A indicação da direção do cemitério era para as famílias procurarem o ossuário, entretanto, apenas um cadáver possuía identificação, “depois do que fizeram aqui, quem garante que seja esta pessoa mesmo que está ai. Por acaso exumaram os corpos”, disse um professor que também procurava a sepultura do irmão.

Dezoito caminhões de aterro que adubavam a Praça José de Souza Dami tiveram que retomar ao cemitério, entretanto, os ossos se misturaram impossibilitando a identificação dos corpos

Entenda o caso

No dia 05 de Setembro deste ano a prefeitura foi indiciada pelo Ministério Publico Federal pelos crimes de violação de sepultura, vilipendio a cadáver entre outros, porque, aterrava uma praça, no bairro Cristo Redentor, com terra deste cemitério. Mas, o que realmente ocasionou a abertura do processo é que o “aterro” continha restos mortais.

Violaram centenas de sepulturas, onde foram avistados restos de caixão, ossada humana, roupas, dentadura e pedaços de lápide nos montes de terra da Praça. O mau cheiro tomou conta do bairro, além do risco de propagar uma epidemia sem precedentes. O caso está no MPF. O capital do Pantanal tentou entrar em contato com o promotor responsável, mas o órgão só funciona no período da tarde. A diocese de Corumbá foi procurada para falar sobre o horário da missa, mas não atendem ao telefone.

Desrespeito

Dezoito caminhões de aterro que adubavam a Praça José de Souza Dami tiveram que retomar ao cemitério, entretanto, os ossos se misturaram impossibilitando a identificação dos corpos. E a conseqüência deste crime foi o que ocorreu durante toda esta quarta-feira (02) de Novembro. Centenas de famílias carentes tiveram o tumulo de parentes profanados de forma aviltante e nunca vista em Corumbá. Quem presenciou a cena deprimente e o desespero das pessoas em encontrar sequer um objeto que fizesse referencia aos falecidos, se chocou com tanta tristeza, “não da para aceitar uma situação destas”, lamentava o professor.

E o dia de finados foi- literalmente- um dos dias mais dolorosos para as vítimas do descaso no cemitério Nelson Chamma. (Capital do Pantanal)

 

Por: Da Redação